Meu filho a caminho de Jericó e a estalagem do meu lar

18:50:00





À medida que o tempo vai passando e nossos filhos crescem, precisamos lidar cada vez mais com uma personalidade distinta, com alguém que está tornando-se ele mesmo, com suas virtudes e vícios, amores e desamores. E não é fácil. Lentamente observamos que estamos perdendo aquele controle, aquela influência soberana. E precisamos aprender a lidar com alguém pecador, carente da graça e desesperadamente necessitado de ajuda. E é aqui que a parábola do Bom Samaritano fala aos meus dias.


Quando a lemos, logo pensamos que devemos ajudar a quem quer que esteja em nosso caminho necessitando de cuidados, amor, atenção. Eu acredito que os cristãos sinceros pensam aplicar esta verdade tão logo encontrarem pessoas assim, porém é sempre um pensamento distante, de alguém desconhecido ou até  mesmo um inimigo. Os intérpretes da passagem sempre enfatizam a rivalidade que havia entre os samaritanos e os judeus, reforçando ainda mais essa ideia. Está tudo certo com essa interpretação. Mas o significado da história não pára por aí. Essa parábola fala alto nos nossos dias, nas relações em família, no contato diário com os filhos.


É normal sentir-se fatigada com criaturas dependentes que paradoxalmente têm espíritos independentes. É normal falar consigo mesma, várias vezes, que está cansada de repetir as mesmas coisas, sem sucesso. É normal sentir que está perdendo a batalha, quando você cede a todo esse desespero e age como um verdadeiro inimigo. O ciclo é mais ou menos assim: você observa o mal comportamento da criança e vê que precisa de correção. Logo você se coloca como aquela que deve instruir antes que outros façam, trazendo vergonha para você e expondo seu filho ao ridículo. Você chama então para uma conversa. Aproxima-se cheia de amor e com sincero desejo de ensinar o bem e as boas virtudes. Sente-se uma verdadeira mãe confiante, revestida de uma experiência de dar inveja àquela criança. A conversa começa bonita, mas a resposta ao ensinamento é adversa. Você percebe os sinais de reprovação e imposta o tom da voz, enchendo-se de autoridade. Nada funciona. Até que você cede aos apelos de sua própria justiça e não mais age como mãe, mas como uma autoridade implacável e disposta a declarar todo o juízo que há sobre as más obras da criança. Nesse ponto, você já desistiu. E tudo termina com um sentimento de tristeza que a leva aos pés de Jesus perguntando: "O que há comigo? Sou uma mãe fracassada! Como eu devo proceder para obter sucesso? O que é que eu faço, Senhor? Por favor, me responda!"



Eu estava assim e, como de costume, saí da oração e peguei minha Bíblia. Ela sempre me guia, me renova as forças, concede luz para o meu caminho. Ela é tão singela... mas tão cheia de tesouros de muito valor! Abro em Lucas 10, nessa linda história contada por ninguém menos que Jesus! Sim, Ele estava ali comigo falando bem ao meu coração. Ele me disse:



"Pense em mim como o Bom Samaritano. Sou como aquele estrangeiro que levantei teus filhos feridos, marcados pelos golpes do ladrão que ronda este mundo em busca de almas para tragar (lembras de Jó? Ele sempre vem de 'rodear a terra e passear por ela'). Teus filhos serão marcados pelos golpes sangrentos do vil tentador, mas eu vim para erguê-los! Eu coloquei óleo nas feridas do orgulho, da soberba, do olhar altivo e teimoso. Eu os trouxe e deixei-os na estalagem do teu lar. Dei ordens para que tu cuides deles. Eu vou voltar para saber como eles estão. Voltarei e pedirei contas deste trabalho. Vou trazer comigo a tua recompensa pelo trabalho de tua alma. Eu já abri o caminho para Deus, já facilitei o acesso ao Trono da Graça. Eu penetrei nos céus e coloquei-me diante do Pai em súplica por ti, mãe. Eu me compadeço das tuas fraquezas, Eu entendo tua dor. Eu mesmo passei por elas quando tive que lidar com a teimosia de Pedro, a incredulidade de Tomé, a ingratidão dos nove leprosos, a traição do discípulo em quem mais confiava. Sim, eu experimentei tudo isso na minha pele. E fiz isso por ti.


Agora, assim como Eu me compadeço de ti e entendo tuas dores para formar a mim no coração de teus filhos, compadece-te deles concedendo-lhes o benefício do perdão, abrindo as portas da misericórdia, revelando o amor que tenho revelado a ti. O trono do Pai é o trono da graça. Você pode se aproximar dele e alcançar a misericórdia. Mas não esqueças: eu te coloquei como mordomo, como cuidador temporário destas crianças. Eles caíram e Eu os ergui e limpei suas feridas, mas o trabalho ainda não acabou. Eu deixei em tuas mãos a responsabilidade de abrir o caminho para Mim, para minha volta, e você precisa manifestar a eles o que eu tenho manifestado a ti. Mostre a misericórdia e o perdão. Mostre a graça, a graça que te alcançou. E lembra-te de que há um tempo oportuno. O teu tempo com eles é breve. A tua ajuda é só por um momento. Quando Eu chegar, como encontrarei este hóspede? Não reclame do cansaço, pois ele sempre acompanha o trabalho desde que o pecado entrou neste mundo. O teu serviço não será em vão. Eu virei com a recompensa."


Ele me consolou assim, trazendo à minha lembrança o que me pode dar esperança. Isso tem sido o meu refúgio quando o vendaval chega para açoitar meus mais lindos planos de ver Cristo formado em meus filhos. As feridas em suas almas não devem despertar em mim sentimentos de frustração, mas de firme convicção de que aquEle que penetrou nos céus, meu precursor, deixou aberto o caminho para que a esperança me guie até ao Trono da graça, a fim de que eu possa ajudar e ser ajudada em tempo oportuno. Essa esperança é como âncora da minha alma. Ela é firme e penetra até ao interior do véu (Hb 6:18-20).


A história do Bom Samaritano é um belo reflexo da misericórdia de Deus em Cristo, compadecendo-se de miseráveis viajantes. Nossos filhos, assim como aquele viajante, já nasceram descendo o caminho perigoso como tolos e imprudentes, expondo sua insensatez ao andar por onde não deveriam e fazer aquilo que não deveriam fazer. O pecado os derrubou e os acorrentou. Mas Jesus não os rejeitou, como não rejeitou a nós. Não podemos ser negligentes na misericórdia como foram o sacerdote e o levita.


A religiosidade, representada pelo sacerdote, não pode curar as feridas dos nossos filhos. Cumprir rituais religiosos são importantes, mas não salvam. Eu entendi que não é meu desejo de ensiná-los na Verdade que eles serão salvos de si mesmos e dos perigos do mundo. Todo esforço, sem amor, nada é. E o amor é uma Pessoa. Podemos ser meticulosos no cumprimento dos rituais sagrados e ao mesmo tempo perdermos de vista a alma moribunda de nossos filhos. Essa é uma verdade que me espanta. Devo ensinar, estabelecer as tradições que serão como muro protetor, mas elas são apenas limites e podem, por um descuido, também ser impedimentos para o Amor.


O conhecimento, representado pelo levita curioso, também não resolve o problema do pecado. Podemos ler sobre os dilemas da juventude, buscar conselhos e aplicar técnicas da ciência que estuda o comportamento humano. O conhecimento é curioso, chega perto para analisar a ferida, mas não é compassivo. O levita foi e olhou, mas passou adiante. O conhecimento humano busca saber, mas não ajuda. Ele pode analisar profundamente a trajetória do caminho, explicar as marcas no corpo do ferido, pode até mesmo justificar sua inoperância em salvá-lo, alegando que o lugar é sombrio demais para demorar e levantar o caído. Não é assim o nosso conhecimento intelectual a respeito do pecado? Sabemos o que motiva a teimosia, somos precisos no diagnóstico, mas ele não resiste ao tempo e nem às condições do ambiente e da pessoa. O simples conhecimento, sem o amor, é impaciente e soberbo. Devemos ter cuidado com ele, quando se mostra mais urgente do que a compaixão. 


Por fim, o único que pode salvar nossos filhos é aquEle que tem compaixão. Jesus é o samaritano desprezado, mas compassivo, que mostra misericórdia e salva aquele que estava em inimizade com Ele. Ele manifesta o amor de Deus, mostrando a misericórdia do auto-sacrifício que mata a inimizade (Ef 2.16).


O bom samaritano tem as características de Jesus, aquele veio buscar e salvar os que estão perdidos. Ele veio até nossos filhos, exatamente onde estão, na condição de pecadores, sem a menor capacidade de fazer nada por si mesmos. Ele tem compaixão e apesar de estarem cheios de feridas e contusões, Ele as ligou, derramando o óleo do Espírito Santo. Ele os colocou sobre seus ombros, dando-lhes o direito de serem filhos de Deus. Ele os leva para uma pousada. Nosso lar é a pousada e nós somos ajudantes do Senhor nessa obra. Ele providenciou cura através de pessoas comuns, como eu e você. E deixou uma promessa: "Eu vou, mas voltarei para vós". Cristo padeceu por nós, deixando-nos o exemplo, para que sigamos as suas pisadas (1Pedro 2:21). 



Ele disse: "...na medida em que fizestes a um destes meus pequeninos, a mim o fizestes". Quando Ele voltar, recompensará nossos feitos (Mateus 25:40).


Portanto, "Vai e faze da mesma maneira" (Lc 10.37). 



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"E, respondendo Jesus, disse: Descia um homem de Jerusalém para Jericó, e caiu nas mãos dos salteadores, os quais o despojaram e, espancando-o, se retiraram, deixando-o meio morto. E, ocasionalmente, descia pelo mesmo caminho certo sacerdote; e, vendo-o, passou de largo. E, de igual modo, também um levita, chegando àquele lugar e vendo-o, passou de largo. Mas um samaritano que ia de viagem chegou ao pé dele e, vendo-o, moveu-se de íntima compaixão. E, aproximando-se, atou-lhe as feridas, aplicando-lhes azeite e vinho; e, pondo-o sobre a sua cavalgadura, levou-o para uma estalagem e cuidou dele; E, partindo ao outro dia, tirou dois dinheiros, e deu-os ao hospedeiro, e disse-lhe: Cuida dele, e tudo o que de mais gastares eu to pagarei, quando voltar." 


Lucas 10:30-35


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Adna S Barbosa


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2 comentários

  1. Nunca havia interpretado esta parábola assim. Muito obrigada

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    1. Também não. Foi nesse momento de dúvidas que li este texto e o Espirito Santo falou claramente comigo.

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