Hoje eu lembrava do tempo em que eu era criança. Lembrava de como minha mãe nos treinou (a mim e às minhas cinco irmãs) para a vida. Não tínhamos luxos, roupas de marca, escolas caras.
Éramos oito, formando uma família. Minha mãe não tinha tempo para gastar com futilidades. Tudo era muito corrido, da hora do café à hora de dormir, de noite. Ela, muito sábia, deixava as crianças pré-escolares gastar o tempo à toa. Subíamos em árvores, inventávamos histórias, éramos crianças.
À medida que crescíamos, assumíamos responsabilidades. Cada uma cuidava de um dever: lavar os pratos, arrumar a casa, lavar roupas. E assim ajudávamos esta nobre mulher na sua labuta diária. Crescia mais um pouquinho, e já íamos para as filas dos bancos pagar as contas de casa. No começo, ficávamos na fila guardando o lugar enquanto ela fazia a feira. Depois que aprendíamos a contar dinheiro, pagávamos sozinhas as contas de luz, água, telefone. Crescia mais um pouco e já podia ir sozinha para o supermercado comprar o pão e o leite. Às vezes, percorria um longo caminho cheia de sacolas pesadas, torcendo para avistar minha velha casa.
Éramos oito, formando uma família. Minha mãe não tinha tempo para gastar com futilidades. Tudo era muito corrido, da hora do café à hora de dormir, de noite. Ela, muito sábia, deixava as crianças pré-escolares gastar o tempo à toa. Subíamos em árvores, inventávamos histórias, éramos crianças.
À medida que crescíamos, assumíamos responsabilidades. Cada uma cuidava de um dever: lavar os pratos, arrumar a casa, lavar roupas. E assim ajudávamos esta nobre mulher na sua labuta diária. Crescia mais um pouquinho, e já íamos para as filas dos bancos pagar as contas de casa. No começo, ficávamos na fila guardando o lugar enquanto ela fazia a feira. Depois que aprendíamos a contar dinheiro, pagávamos sozinhas as contas de luz, água, telefone. Crescia mais um pouco e já podia ir sozinha para o supermercado comprar o pão e o leite. Às vezes, percorria um longo caminho cheia de sacolas pesadas, torcendo para avistar minha velha casa.
Cresci mais um pouco e casei. Tive que lidar com minhas próprias contas, minhas feiras, meus deveres diários. Não foi um fardo pesado demais. Aperfeiçoei minhas habilidades e hoje estou com três crianças para treiná-las para a vida. Às vezes, fico com pena de impor uma tarefa pesada demais para meus filhos. Afinal, eles são pequenos. No entanto, preciso preparar-me para amanhã.
Diferente da minha mãe, cresci ouvindo alguns experts em educação afirmarem que lugar de criança é ou na escola, ou no parque, ou jogando (esse último me dá arrepios!) independente da idade. Calcule o prejuízo se levarmos em conta que a infância de hoje, na prática, se estende até os 14 anos ou mais! "Criança não trabalha, criança dá trabalho", diz os atuais poetas de músicas infantis.
A cultura brasileira subtendida ou declarada corrobora essa premissa. As crianças ao meu lado mal sabem o que é dever, a não ser o dever escolar (e olhe lá!). Diante disso tudo, tenho um enorme desafio.
E então uso um recurso que nunca me falha quando quero "provar" uma verdade. Tento relembrar os deveres a mim impostos, os sentimentos que tinha enquanto crescia, e como tudo isso modelou meu caráter. Interessante que o que passou na peneira dos anos não foram as queixas, não foi o cansaço, nem mesmo o tempo que deixei de brincar ou estudar para fazer o serviço. Depois de algum tempo eu consigo discernir com mais precisão o que me fazia ser responsável nas tarefas de casa. A sabedoria da minha mãe em colocar suavemente cargas mais pesadas à medida em que crescia, tornou quase que imperceptível os esforços da virtude, e fez-nos sentir parte integrante de uma família, cuja responsabilidade de amar, cuidar e prover era função de todos. E então, ansiávamos por aquele momento em que nos tornaríamos mais atuantes, nos sentiríamos mais completos, sendo pessoas capazes de contribuir no ciclo de amor que envolve a todos nós, no seio da família.
Cumprir os deveres não era um fardo, mas uma honra, ou melhor, uma promoção. Era sair de um estado de impotência e incapacidade, para um estado de plena capacidade de atuação e verdadeira liberdade. E assim crescemos. E hoje me tornei "dona" da própria vida. Nenhum trauma, nenhum tempo perdido, apenas um forte sentimento de gratidão e de admiração que cresce e faz da minha mãe um gigante que às vezes me assombra... Não sei se serei forte o suficiente para vencer as amarras de um tempo vazio que me cerca. Sinto-me muitas vezes esmagada por uma cultura que pouco ou nada conhece sobre o que é família, sobre o que é o amor. Que baseia as relações somente no que pode "ganhar", e nunca no que pode dar.
É nesse momento em que me ajoelho e oro. Eu peço a Deus que me faça conduzir o fio da vida tão sabiamente como minha mãe. Que eu não me deixe vencer pelos discursos do presente, nem por uma suposta felicidade que nega o bem aos outros. Peço a Deus que me faça enxergar não uma criança assumindo responsabilidades, mas uma mulher ou um homem entregando-se pelos seus familiares. A criança que hoje está em minhas mãos era eu no passado. Ela vai crescer e agradecer as escolhas que fiz por ela quando ainda era pequena demais para entender o que era o amor na prática. E que eu possa, acima de tudo, me tornar cada dia mais aquele gigante diante dos seus olhinhos incertos, mostrando o caminho da verdade antiga que fez de muitas crianças, homens e mulheres de verdade.
A vida continua e eu não posso quebrar o fio dos meus antepassados.
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Adna S Barbosa