O perigo da volta às aulas

18:11:00




Imagine que você trabalha num lugar em que o seu trabalho é monitorado todos os dias pelo seu chefe. É dito exatamente o que deve fazer, como fazê-lo e quando fazê-lo. Você é obrigado a permanecer no seu lugar até que seu chefe diga quando pode mover-se. Cada parte de seu trabalho é avaliada e comparada, todos os dias, com o trabalho realizado por seus colegas de trabalho. Raramente confiam que você é capaz de tomar suas próprias decisões. Esse cenário sobre o emprego mostra que esta não é apenas uma situação laboral mais tediosa, mas também a mais estressante. Microgerenciamento deixa as pessoas loucas.

As crianças são pessoas, e elas respondem exatamente como os adultos fazem na microgestão: com severas restrições à liberdade e uma avaliação constante e não solicitada. A escola, muitas vezes, é exatamente como o tipo de pesadelo que acabei de descrever; e, pior ainda, é um trabalho que as crianças não têm permissão para sair. Não importa o quanto eles estejam sofrendo, eles são forçados a continuar, a menos que eles tenham pais esclarecidos e que tenham condições, conhecimentos e vontade de tirá-los deste meio. Incluindo a tarefa de casa, a quantidade de horas que as crianças passam nesse estudo forçado é muitas vezes maior do que a quantidade de horas que seus pais passam em seus empregos em tempo integral, sem falar que a liberdade das crianças para mover-se na escola é muito menor que a dos pais no trabalho.


No final do século 19 e início do século 20, muitas pessoas ficaram preocupados com os efeitos nocivos que o trabalho infantil desencadearia no desenvolvimento e bem-estar das crianças, e, por isso, foram aprovadas leis para proibi-lo. Mas agora temos a escola, e a expandimos de tal forma que o tempo gasto nela equivale a um emprego em tempo integral - um trabalho psicologicamente estressante e sedentário, para o qual a criança não é paga e não ganha o senso de independência e orgulho de que pode receber de um trabalho real.

Eu já mostrei que as crianças, especialmente os adolescentes, são menos felizes na escola do que em qualquer outro ambiente onde elas se encontram regularmente e que o aumento da escolaridade, juntamente com a diminuição da liberdade fora da escola, correlaciona, ao longo de décadas, com o acentuado aumento das taxas de transtornos psiquiátricos em jovens, incluindo, principalmente, a depressão e os transtornos de ansiedade .

Estamos, agora, começando a ver os anúncios "de volta à escola", e eu me pergunto sobre a relação entre a saúde mental das crianças e o ano letivo. Observei uma relação entre o número de visitas à emergência psiquiátrica por crianças em idade escolar que ocorrem a cada mês. Essas visitas diminuem no verão, quando a escola (para a maioria das crianças) não está em atividade?


Em uma pesquisa bastante extensa da literatura publicada, encontrei apenas um conjunto de dados publicamente disponível sobre isso - em um artigo on-line sobre as visitas psiquiátricas de emergência das crianças no Centro Mental Infantil de Connecticut em Hartford ( aqui ). O ponto principal do artigo foi que tais visitas aumentaram dramaticamente nos últimos anos e os tempos de espera na emergência aumentaram. No entanto, um gráfico interativo no artigo mostra o número dessas visitas de emergência por cada mês, para cada ano de 2000 a 2013. Mesmo um rápido olhar no gráfico tornou óbvio que, a cada ano, o número de visitas caiu no verão e aumentou novamente no ano letivo.

Para quantificar isso, calculei o número médio de visitas, por mês, por três anos- 2011 a 2013. Incluí apenas as visitas que foram suficientemente graves, as que levaram, pelo menos, uma pernoite na emergência. Aqui estão os dados:



Fonte: Charlie Hoehn



Assim como eu previ, julho e agosto são os meses com, de longe, o menor número de visitas psiquiátricas na emergência infantil. De fato, o número médio de visitas para esses dois meses combinados (70 por mês) é inferior à metade da média durante os meses completos (142 visitas por mês para os nove meses, excluindo junho, julho e agosto). Junho, que tem alguns dias escolares (sofre uma variação dependendo do número de dias nos quais que nevam), também é baixo, mas não tão baixo quanto julho e agosto. Curiosamente, e não previsto pela minha hipótese, setembro também é relativamente baixo, equivalente a junho. Parece plausível que setembro seja um mês de preparo na escola; testes sérios, trabalhos pesados ​​e boletim de notas estão por vir. Pode demorar algumas semanas na escola antes do estresse realmente começar.


Alguém pode argumentar que a variação sazonal em crises de saúde mental reflete o clima, e não o ano letivo. No entanto, esse argumento cai por terra quando olhamos para os outros meses. O mês com maior taxa de visitas das crianças à emergência psiquiátrica é maio, e maio é geralmente o mês mais difícil da escola. O mês de maio é o mês das provas finais e do fechamento das notas.


Estes, é certo, são dados de apenas um centro de saúde mental infantil. Eu gosto de procurar mais dados para testar a hipótese. Se você conhece esses dados, ou se você está motivado a fazer alguma pesquisa para descobrir esses dados de um centro de saúde mental infantil em sua comunidade, avise-me! Enquanto isso, se você é pai de uma criança em idade escolar pensando em "voltar para a escola", mantenha isso em mente: as evidências disponíveis sugerem muito que a escola é ruim para a saúde mental das crianças. Claro, é ruim para sua saúde física também; A natureza não projetou crianças para estarem trancadas o dia inteiro em um trabalho duro e microgerenciado.


Peter Gray

(artigo publicado em 07/08/2014)




______________________
Leia aqui o texto original

You Might Also Like

0 comentários

Visualizações

Like us on Facebook

Flickr Images

Subscribe