Vida de Patroa, não! Vida de Serva!

18:11:00


Hoje, enquanto esperava minha consulta médica, fui forçada a assistir Ana Maria Braga, no Mais Você. É um programa esquisito, pra gente esquisita. A apresentadora é a marca maior dessa esquisitice. Uma mistura de mulher malhada, surfista, com idosa-sem-vergonha, com perua, com espantalho, com... Bem, eu não sei exatamente o que aquela mulher pensa que é. Só não sei o que é ao certo. Minha sugestão para a globo seria mudar o nome para "Menos Você, com Ana Maria Brega".

Divagações à parte, vamos ao que importa. Enquanto assistia esse tosco programa, descobri que nele há um quadro chamado "Dia de Patroa". Lá, pessoas comuns (leia-se, empregados) são homenageadas com um dia parecido com o daqueles das dondocas: salão, shopping, restaurantes caros etc. Um dia pra fazer somente o que uma patroa fútil e vazia faz.

Uma família procurou o programa para homenagear sua funcionária que há vinte anos abnegadamente trabalhava em sua casa, sendo mãe, dona de casa, terapeuta, babá, acompanhante, cozinheira, etc... Essa mulher havia deixado sua família (2 filhos) para dedicar-se a esta outra família. Até aí, tudo bem. Esse tipo de troca não é de hoje.

Mas, o que achei intrigante, e ainda estou queimando meus neurônios para entender, foi a pergunta inicial feita pela repórter à funcionária, logo que a surpreende com a visita: "Faz tempo que você não vai a um salão de beleza, não é?" e "E viagens? Aposto que quase não faz!". A mulher, com um aspecto bem feliz, aspecto de quem está satisfeita com a vida de trabalho que levava, responde positivamente àquelas insinuações. E depois, bem, vocês já sabem, o anúncio: "Hoje você terá um dia de patroa!". E lá vai aquela babozeira que vocês conhecem bem.

Pensei: "que gente esquisita!". Ao homenagear aquela mulher que amorosamente os servia em seu lar com um "Dia de Patroa", nas entrelinhas estavam a negar a própria razão da homenagem - o reconhecimento pelo serviço, ao colocar num patamar inferior de realização a escolha daquela nobre mulher. Sim, ela escolhera servir. Ela doava-se no lar de seus patrões. E amava ser e fazer isso. Parece que eles não perceberam que a felicidade daquela mulher era superior a deles mesmos, e como os que desconhecem o prazer de servir, resolvem oferecer-lhe a vida vazia de "dondoca" em que viviam.

Vejam como essa nossa cultura de massa desconhece a natureza da verdadeira alegria e realização. Medem tudo e todos com as réguas do status e do poder financeiro e social, e assim, reforçam ainda mais a suposta superioridade de realização pessoal dos que tem dinheiro.

Mas o tiro saiu pela culatra. Sem querer, não sei se querendo, a nobre funcionária termina o dia com um jantar num restaurante chique, com as duas famílias. E, contrariando a lógica dos patrões e da anta da Ana Maria Brega e demais produtores da globo, a mulher reforça a minha tese inicial, dizendo: "Se não puderem mais me pagar, continuarei aqui, de graça, com vocês. Vocês são minha família". Um tapa na cara daquela família tola. Traduzindo, ela quis dizer mais ou menos isto aqui: "não preciso de salão, de faxineira para limpar minha casa, nem de restaurantes chiques, nem mesmo do dinheiro de vocês para ser feliz. Eu preciso de vocês, eu me realizo sendo útil nesse lar e não faço isso por dinheiro, mas por amor".

O que aqueles patrões não sabiam é que para aquela mulher ser diva era fazer exatamente o que fazia. Nem mais, nem menos. Mas eles não são os únicos que desconhecem o verdadeiro sentido da realização pessoal. Eles são apenas fruto de uma sociedade que não entende (e parece-me que não há remédio para essa patologia cognitiva) que a felicidade e realização pessoal não mora nos bairros chiques, não precisa frequentar shoppings, muito menos salões de beleza (que, convenhamos, são centros de feiura). A realidade, pelo contrário, mostra que esses lugares são redutos de gente infeliz, que pouco se aceitam como pessoas.

O ideal para a existência humana não é lazer, pernas pro ar, e compras sem fim. Não. Mas esforço em prol do bem estar daqueles que nos cercam, uma vida como oferta para outros. Se vemos nossas ocupações, sejam elas quais forem, como "máscaras de Deus", entenderemos que ele age através de nós secretamente, trazendo significado e vida para os que nos cercam. O que o mundo (e alguns de nós) precisa saber é que dinheiro ou trabalho bem remunerado não é a única coisa que nos dá senso de dignidade. Sucesso é sentir que veio cumprir uma grande missão nesse mundo, seja para uma multidão ou para uma vida, recebendo dinheiro ou não. Sucesso é sentir que contribuímos para algo maior que nós. Somos treinados para valorizar apenas a esfera pública, os aplausos, a fama, mas não somos treinados a valorizar as pequenas conquistas dentro das quatro paredes do nosso lar, como um bom casamento, uma boa alimentação, um bom relacionamento construído com cooperação, amor e renuncia.

Mas o mundo real não é o mundo das conquistas lá fora. Mundo real é aquele que nos permite viver livre e profundamente para amar hoje. Temos apenas uma vida para viver. E é melhor vivê-la para os outros, em total entrega. Jesus é o nosso padrão de dignidade, trabalho e sucesso. Ele sabia quem era e não estava preocupado com a opinião dos outros. Por isso, Ele pôde vestir a toalha e lavar os pés, ser empregado, com dignidade. Jesus se oferece totalmente e derrama a sua vida finalmente na cruz, como um malfeitor, por nós. Isso é que é grandeza. Isso é que é "Vida de Patroa". Deus quer que entendamos a razão de estarmos plantados onde estamos plantados. Nada de comparações. Nada de vergonha. Nada de medo. Somos o que somos para a glória de Deus. Estamos envolvidas na construção de uma grande história. Vida real não acontece lá fora. Acontece aqui. Dentro do lar. Não precisamos de uma vida de patroa. Precisamos de uma vida de servas, se quisermos mais significado para nossas vidas.

(Adna S Barbosa)

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